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Dostoievsky afirmou certa vez: "Temo somente uma coisa: não ser digno do meu tormento." Essas palavras só podiam mesmo ficar passando muitas vezes pela cabeça da gente quando se ficava conhecendo aquelas pessoas tipo mártir, cujo comportamento no campo de concentração, cujo sofrimento e morte testemunham essa liberdade interior última do ser humano, a qual não se pode perder. Sem dúvida, elas poderiam dizer que foram "dignas dos seus tormentos". Elas provaram que inerente ao sofrimento há uma conquista, que é uma conquista interior. A liberdade interior (geistig) do ser humano, a qual não se lhe pode tirar, permite-lhe até o último suspiro configurar a sua vida de modo que tenha sentido. Pois não somente uma vida ativa tem sentido, em dando à pessoa a oportunidade de concretizar valores de forma criativa. Não há sentido apenas no gozo da vida, que permite à pessoa a realização na experiência do que é belo, na experiência da arte ou da natureza. Também há sentido naquela vida que - como no campo de concentração - dificilmente oferece uma chance de se realizar criativamente e em termos de experiência, mas que lhe reserva apenas uma possibilidade de configurar o sentido da existência, precisamente na atitude com que a pessoa se coloca face à restrição forçada de fora sobre seu ser.
(...) então nos ocorre esse ou aquele detalhe dessa ou daquela história da grandeza interior de determinada pessoa - como por exemplo a história de uma mulher jovem morrendo no campo de concentração, da qual fui testemunha. A história é singela, não há muito o que contar, e mesmo assim ela soará como que inventada, de tão poética que ela se me afigura.
Essa jovem mulher sabia que teria que morrer nos próximos dias. Quando falei com ela, ainda assim estava bem disposta. "Sou grata a meu destino por ser assim tão duro comigo", foi o que ela me disse textualmente, "pois em minha vida burguesa anterior eu estive mal-acomodada demais e minhas ambições espirituais não eram lá muito sérias."
Viktor Frankl, Em busca de Sentido.
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