Com a renda que tem, o Brasil poderia ter um sistema educacional melhor? E por que não tem?
por Roberto Ellery Roberto Ellery
Fonte: aqui.
Explicar o que faz com que os estudantes de um determinado país sejam bem avaliados em exames internacionais e os de outros sejam mal avaliados não é uma tarefa fácil, nem simples; pelo contrário, exige um esforço de coleta e análise de dados significativo, de forma a permitir ao pesquisador avaliar diversos fatores que podem determinar o desempenho dos estudantes.
É possível que um país gaste muito com educação, porém seu gasto não seja bem canalizado para permitir o melhor aprendizado dos alunos – uma escola de ouro sem bons professores, afinal, dificilmente formará bons alunos. Também é possível que questões culturais, além de outros fatores que não dependem da escola em si, tenham um papel significativo no desempenho do aluno. Um estudante em uma boa escola, com bons professores, pode ter seu desempenho prejudicado por uma família ou uma vizinhança abusiva, ou por um meio cultural que desestimule seus estudos. São muitos aspectos, de forma que não é pretensão deste texto esgotar ou mesmo fazer uma abordagem científica do tema. A ideia do texto é tão somente argumentar que com a renda per capita que tem, o Brasil poderia ter um sistema educacional que permitisse a seus estudantes um melhor desempenho nos testes internacionais. Dito de outra forma: nossa pobreza não é desculpa para nossos resultados ruins.
Para apresentar meu argumento, peguei a nota de cada país no programa internacional de avaliação de alunos – o PISA de 2012 – e comparei com o PIB per capita de 2011. Escolhi 2011, porque esse é o último ano da Penn World Table (PWT). Reproduzi as contas com dados do FMI para 2012 e os resultados foram os mesmos – como a PWT permitiu usar mais países, escolhi não usar os dados do FMI.
O PISA é composto por três provas: leitura, ciências e matemática. Para a análise usei a média das três provas (link aqui). Consegui dados para 65 países. Após cruzar com a PWT, e retirar outliers, fiquei com 61 países.
Destes 61 países, sete (Albânia, Argentina, Colômbia, Indonésia, Jordânia, Peru e Tunísia) ficaram com média inferior à do Brasil – destes, apenas a Argentina tem PIB per capita maior que o nosso. Por outro lado, China, Tailândia e Vietnam conseguiram médias maiores que a do Brasil – mesmo tendo PIB per capita inferior ao brasileiro. Até aqui não há muito a concluir. Porém alguma conclusão começa a ser esboçada quando observamos que dos 15 países com melhores notas (o quarto superior) sete estão na Ásia (China, Hong Kong, Japão, Coreia, Cingapura, Taiwan e Vietnam) e que dos quinze países com as piores notas (o quarto inferior) oito são latino americanos (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, México, Peru e Uruguai). Difícil não pensar que existe algo no sistema de ensino da Ásia que faz com que os alunos de países pobres e ricos se saiam bem, ao mesmo tempo em que existe algo no sistema de ensino da América Latina que faz com os alunos apresentem desempenho tão baixo.
A figura abaixo ilustra o ponto. Nela estão marcados o PIB per capita e a média do PISA nos 61 países da amostra, os países da América Latina estão em destaque. Repare que todos ficam abaixo da linha de regressão (para os curiosos o p-value foi 9.82e-09 e o R2 foi 0.43). A linha de regressão mostra o quanto devia ser a nota de cada país para cada valor do PIB per capita. O significado disto é que se usarmos apenas o PIB per capita para explicar o desempenho dos estudantes (espero ter deixado claro no primeiro parágrafo as limitações do exercício) os países latino americanos estão com notas menores do que deveriam.
A próxima figura repete a anterior, porém destaca os países do leste da Ásia (excluindo o Oriente Médio e as antigas repúblicas soviéticas, especificamente Jordânia e Cazaquistão). Repare que, com exceção da Malásia, todos os países estão na linha ou acima da linha. Vietnam e China são particularmente impressionantes no sentido que, mesmo com PIB per capita muito baixo, conseguem excelente desempenho nos exames do PISA. A última figura destaca apenas o Brasil.
Insisto mais uma vez que os resultados desse texto devem ser vistos como uma provocação – ou, quando muito, como uma exploração preliminar. Neste sentido que concluo que existe alguma diferença entre os sistemas de ensino da América Latina e da Ásia que faz com que estudantes asiáticos tenham melhor desempenho no PISA quando comparados aos estudantes latino americanos, mesmo quando se leva em conta o PIB per capita dos países.
Embarcando no clima de provocação e fazendo uma pequena homenagem ao pessoal do Instituto Liberal do Centro Oeste (ILCO), que andou sendo criticado pelo crime supremo de questionar a obra de um intelectual respeitado, vou chamar este efeito que diferencia os estudantes da Ásia dos estudantes da América Latina em geral e do Brasil em particular de Efeito Paulo Freire. Assim, além de homenagear o ILCO, também faço uma reverência ao “maior intelectual da América Latina” e patrono da educação brasileira.
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